2006/04/02

A gestão dos centos urbanos: diferentes experiências, diferentes modelos

O que se entende hoje por comércio é muito mais do que a mera transacção de bens, pois é cada vez mais frequente que o comércio efectue simultaneamente a venda/ prestação de serviços. Esta reformulação do conceito de comércio significa que a oferta se deve desenhar em torno das preferências da procura, respondendo aos seus novos hábitos e comportamentos de consumo. A importância não só económica mas também social e cultural do comércio é reconhecida por um número crescente de cidades, que optam pela criação de um organismo de gestão do centro urbano, à imagem dos centros comerciais, que envolva os diferentes agentes económicos e políticos, conciliando os seus interesses. Neste domínio, algumas experiências estrangeiras mostram as diferenças entre os modelos europeus e o modelo norte-americano, que se destinguem essencialmente pelos papéis atribuídos aos sectores público e privado.
Na Bélgica, discute-se pela primeira vez o conceito de gestão de centro urbano em 1996, na sequência de uma reflexão em torno das soluções para as dificuldades socio-económicas de Charleroi, uma cidade da região de Wallone que enfrentava problemas de desertificação e desqualificação urbana.
Após a realização de estudos sobre as experiências estrangeiras no domínio da revitalização urbana, o Governo Regional intervém, apoiando financeiramente a criação de um projecto de gestão integrada da cidade. Este projecto contou com a adesão da União do Comércio Independente, do Centro de Formação das Classes Médias e dos empresários. Em 1998 surge a Associação de Gestão do Centro Urbano, destinada à divulgação e implementação do conceito em toda a região. Segue-se a estruturação de um comité de coordenação - de forma a reunir o consenso entre os diferentes agentes - e de uma unidade de gestão do centro urbano, financiada pelos sectores público e privado, a contratação de um gestor de centro urbano e a elaboração de uma campanha de comunicação, que transmita e promova a "identidade da cidade".
Para seguir esta experiência-piloto e assegurar a continuidade deste tipo de modelo, entre outras iniciativas, desenvolveu-se um comité inter-ministerial, um Observatório do Comércio e um Observatório da Habitação, e ainda uma Federação Regional de Unidades de Gestão.
No modelo francês, é a Federação Nacional de Centros Urbanos que dá início a este processo. No entanto, a gestão do centro urbano e os comités de coordenação são co-financiados pelos sectores público e privado, existindo uma parceria, sem fins lucrativos, entre os empresários, os poderes locais, as associações de comerciantes e o Estado. Relativamente às políticas de urbanismo, a decisão final é do município. O Estado, por via do Ministério do Ordenamento do Território, apoia um programa de revitalização urbana, que requer diversos procedimentos: a adopção pelas colectividades locais de um projecto económico e urbanístico coerente; a organização de uma parceria público-privada para a promoção de um centro urbano equilibrado e atractivo; e, finalmente, a nomeação de um responsável do projecto.
Na Suécia encontram-se frequentemente três níveis de associação à escala local: um comité consultivo que agrupa os diferentes intervenientes; um grupo de coordenação que reúne apenas os financiadores; uma unidade de gestão, constituída por três a quatro pessoas que conduzem os grupos de trabalho.
O financiamento destina-se a operações de promoção, geralmente subsidiadas pelos agentes económicos, e operações de melhoria e ordenação do território urbano, na sua maioria financiadas pelos municípios. As primeiras experiência deram-se nos anos 90, trazendo actualmente benefícios a centenas de cidades.
No Reino Unido, o conceito foi desenvolvido nos anos 80 e teve como base o modelo de gestão integrada dos centros comerciais. Em 1991 criou-se a Associação dos Town Centre Management, que proporciona a troca de experiências e a formação dos gestores de centros urbanos. Dois anos depois, membros dos sectores público e privado e um grupo de 70 gestores elaboram um plano directivo de apoio à planificação das intervenções.
O papel do gestor é sobretudo o de mediador. Neste país, uma das dificuldades encontradas está relacionada com a resistência dos empresários ao pagamento de quotas, sendo o financiamento da gestão de carácter público.
Em 1985, surgiu, no Canadá, uma fundação privada sem fins lucrativos, designada "Ruas Principais", com o objectivo de apoiar a revitalização das regiões, de alertar para os problemas patrimoniais e estimular a criação de novas associações regionais.
Esta organização conta com um responsável de projecto e com um comité de gestão, onde participam voluntários, associações de comerciantes e empresários, assim como o município. A neutralidade da fundação favorece o consenso entre parceiros. Tal como no modelo francês, os projectos são financiados tanto pelo sector público como pelo privado.
No final dos anos 70, o declínio dos centros urbanos norte-americanos face à expansão da periferia deu lugar aos Special Assessment Districts, que antecedem os Business Improvement Districts: organizações privadas sem fins lucrativos, que impõem aos proprietários uma taxa destinada à prestação de serviços de interesse comum que, na maior parte dos países europeus, são responsabilidade exclusiva da Administração Pública. As vantagens para os proprietários passam pela valorização a longo prazo das suas propriedades, ao passo que os arrendatários beneficiam a curto prazo do incremento de vendas. A prestação de serviços é negociada com os governos locais, tendo em vista a gestão integrada da cidade.
Em Portugal, o governo tomou a iniciativa, através do PROCOM (Programa de Incentivo à modernização do Comércio), de subsidiar os projectos especiais de urbanismo comercial, regulamentados pelo Decreto-Lei n. 184/94 de 1 de Julho de 1994. Estes projectos uniram esforços de associações de comerciantes e câmaras municipais. De forma a promover a implementação de instrumentos para a modernização da actividade comercial, integrados na dinamização dos centros históricos, a Direcção Geral do Comércio e da Concorrência criou o conceito de "centro comercial a céu aberto".
Entre 1994 e 1999, foram aceites 3493 candidaturas, de 129 concelhos, que corresponderam a um investimento de aproximadamente 56 milhões de contos, sendo que o investimento público se traduziu em cerca de 31 milhões de contos. Segundo a classificação oficial por NUTS II, a região Norte congregou maior número de projectos, maior valor de investimento e financiamento.
As actividades económicas relacionadas com o sector do "vestuário e calçado" e com o canal HORECA (alojamento e restauração) registaram um comportamento mais dinâmico, reunindo maior número de projectos, de investimento e de incentivo.
Em Maio de 2000, o governo português aprovou o URBCOM (Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial). Relativamente ao primeiro programa, o URBCOM introduz a necessidade de descentralização do acompanhamento das candidaturas individuais das empresas, da formação de estruturas de gestão do centro da cidade e do apoio a acções de formação profissional.
Estão actualmente em vigor vários programas de incentivos ao comércio, a saber: SIPIE – Sistema de Incentivos às Pequenas Iniciativas Empresariais (PRIME), URBCOM – Sistema de incentivos a projectos de urbanismo comercial (PRIME) e o MODCOM – Sistema de incentivos a projectos de modernização do comércio (FMC). O MODCOM tem como principal objectivo a modernização e revitalização da actividade comercial em especial: em centros de comércio com predomínio do comércio independente de proximidade; em zonas urbanas ou rurais e a promoção de acções dirigidas ao comércio. Este programa divide-se em três eixos de acção: Acção A – Projectos empresariais individuais autónomos, Acção B – Projectos empresariais individuais integrados, sendo estas duas acções dirigidas a micro e pequenas empresas do comércio, e a Acção C – Projectos de promoção comercial de centros urbanos, dirigida a estruturas associativas do sector do comércio
Em termos gerais, os modelos europeus e norte-americano assentam no desenvolvimento de uma gestão pró-activa das áreas comerciais, através do estabelecimento de uma organização, onde participam representantes do poder político, dos empresários e dos cidadãos/consumidores, de forma a promover os interesses da cidade como um todo.

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